Manaus (AM) – Durante sessão na Câmara Municipal de Manaus, nesta semana, o vereador Jander Lobato (PSD) comentou casos recentes de agressão contra mulheres e defendeu a importância de denunciar e buscar medidas protetivas. No entanto, parte de sua fala gerou repercussão ao atribuir responsabilidade às próprias vítimas pelos relacionamentos que resultam em violência.
Ao tratar do tema, Lobato afirmou que, atualmente, “mulheres saem de festas, dormem com os homens e no outro dia dizem que estão vivendo com o cara”. Em seguida, sugeriu que as mulheres devem “prestar mais atenção” antes de se envolverem, reforçando que “nada justifica a agressão”, mas que é necessário conhecer bem o homem antes de iniciar uma relação.
A fala foi interpretada por entidades da sociedade civil como uma tentativa de responsabilizar a vítima de violência doméstica, o que pode reforçar estigmas e dificultar a denúncia. Especialistas alertam que esse tipo de discurso ignora a complexidade do ciclo da violência e minimiza a responsabilidade dos agressores.
O vereador Jander Lobato também criticou a fragilidade das medidas protetivas disponíveis para mulheres vítimas de violência. Segundo ele, embora essas medidas representem um recurso legal importante, muitas vezes não garantem a segurança das vítimas, pois demoram a ser concedidas pela Justiça e, quando efetivadas, ainda assim não impedem novos episódios de agressão.
Transferência de responsabilidade
A declaração foi duramente criticada pela psicóloga Marília Freire Para e ativista do movimento feminista de Manaus, que classificou como “criminosa”, a fala do parlamentar, pois transfere a responsabilidade da violência do agressor para a vítima”. Segundo ela, essa lógica misógina perpetua uma estrutura social que normaliza a violência e silencia as mulheres.
“Dizer que as mulheres precisam prestar atenção nos homens com quem se envolvem para que não sofram violências é de uma misoginia sem tamanho. Somos vítimas até daqueles que são ‘bons moços’ para a família e na roda de amigos. Por mais atentas que estejamos, nossos algozes muitas vezes mascaram muito bem a sua face violenta, que às vezes só se manifesta frente a um descontentamento ou quando sentem que perderam o poder que acham que têm sobre nós, nossos corpos e afetos”, afirmou Marília Freire.
Segundo a especialista em Direito Penal e Processual Penal e mestranda em Psicologia no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), onde pesquisa meninas-mães no estado, a violência contra as mulheres existe porque está enraizada, entre outras coisas, na ideia milenar que culpabiliza as vítimas pelo que sofreram.
“Se ainda estamos nesse patamar de índices tão altos de feminicídios, violência contra crianças, adolescentes e idosas, é porque a violência encontra abrigo em discursos como o do parlamentar, que num lugar de poder e de representação do povo se dá ao escárnio de derramar todo seu desprezo pela vida, saúde e integridade de todas nós”, concluiu a psicóloga.
Em 2024, o Amazonas registrou 33 casos de feminicídio, dos quais 15 foram cometidos por parceiros ou ex-parceiros. O estado também contabilizou 604 casos de violência contra a mulher, ficando atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro entre os estados monitorados pela Rede de Observatórios da Segurança.
A reportagem questionou o vereador, por meio da assessoria, sobre a declaração na CMM, mas não teve resposta até publicação da matéria.
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